sábado, 19 de março de 2005

D. Maria

Conheci-a quando vim morar para Vendas Novas. Estava a viver num lugar provisório devido às obras em minha casa, e ela vivia do outro lado da rua. Era uma senhora na casa dos oitenta, marcada pelo tempo, amparada pela bengala, que um dia veio conversar comigo dizendo-me que não dormia há uma semana porque tinha um problema sério. Tinha aceite Jesus no seu coração (por intermédio de uma amiga nossa) mas não sabia como lidar com uma promessa que tinha feito a "Nossa Senhora" e que ainda não tinha pago. Achava que a promessa tinha que ser paga, ou então ela não teria descanso. Como sabia que a nova fé não comportava tais compromissos decidiu voltar à velha forma e assim dormir descansada. De nada valeu dizer-lhe que tal figura não existe.
Esta semana recebi a notícia de que a D. Maria se suicidou com comprimidos no recato e solidão da sua casa. A vida para ela chegara ao fim, quiçá por falta de sentido.
Acredito que aquele momento em que ela vislumbrou uma forma de vida diferente podia ter feito toda a diferença. Cristo faz toda a diferença quando o encontramos pessoalmente. A crendice e a superstição tão próprias da religiosidade portuguesa só ajudaram a aumentar o vazio da alma desta pobre senhora. Esta é a realidade espiritual do Alentejo e porque não, de todo o Portugal. Gente agarrada a imagens e ritos que não trazem vida; apenas aprofundam e aceleram a morte.

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